domingo, 1 de dezembro de 2019

Anita Malfatti



Anita Malfatti

Filha do engenheiro italiano  Samuele Malfatti e de mãe norte-americana Eleonora Elizabeth "Betty" Krug, Anita Malfatti nasceu na cidade de São Paulo, em 2 de dezembro de 1889. Segunda filha do casal, nasceu com atrofia no braço e na mão direita. Aos três anos de idade foi levada pelos pais à cidade de  Lucca, na Itália,  na esperança de corrigir o defeito congênito. Os resultados do tratamento médico não foram animadores e Anita teve que carregar essa deficiência pelo resto da vida. Voltando ao Brasil, teve à sua disposição Miss Browne, que a ajudou no desenvolvimento do uso da escrita e no aprendizado do desenho com a mão esquerda. Essa Miss Browne deve ter sido a educadora norte-americana Márcia P. Browne que assessorou  Caetano de Campos  na reforma que empreendeu no ensino primário e normal em São Paulo, nos primórdios da República. Miss Browne organizou e foi a primeira diretora da Escola Modelo anexa à Escola Normal.
Iniciou seus estudos em  1897  no Externato São José de freiras católicas, hoje não mais existente, outrora localizado na  Rua da Glória,  onde foi alfabetizada. Logo depois passou a estudar em escolas protestantes: na  Escola Americana,  em 1903, e pouco depois no  Mackenzie College  onde, em  1906,  recebe o diploma de normalista.

Surge a pintora

Nesse meio tempo morreu Samuele Malfatti, esteio moral e financeiro da família. Sem recursos para o sustento dos filhos, Betty passou a dar aulas particulares de idiomas e também de desenho e pintura. Chegou a pedir orientações do pintor  Carlos de Servi  para ela com mais segurança ensinar suas discípulas. Anita acompanhava as aulas que tomavam a maior parte de seu tempo, foi portanto sua própria mãe quem lhe ensinou os rudimentos das artes plásticas.

Na Alemanha


Anita pretendia estudar em Paris, mas sem a ajuda do pai parecia impossível, tendo em vista que sua avó vivia entrevada numa cama e sua mãe passava o dia dando aulas de pintura e de idiomas. Anita tinha umas amigas, as irmãs Shalders, que estavam prestes a viajar à  Europa,  para estudar  músiica. . Assim surgiu a ideia de acompanhá-las à  Alemanha  e seu tio e padrinho, o engenheiro Jorge Krug, aceitou financiar a viagem.
Anita e as Shalders chegaram a  Berlim em 1910,  ano marcante na história da  Arte Moderna  alemã. Berlim era então o grande centro musical da Europa. Acompanhando suas amigas às aulas no centro musical, ali recebeu a sugestão para estudar no ateliê do artista pintor  Fritz Burger.
 Fritz Burger era um retratista que dominava a técnica pontilhista ou divisionista. Foi o primeiro mestre alemão de Anita. Nessa época ela ingressou na Academia de Belas Artes de Berlim.
Durante as férias de verão, Anita e as amigas foram às montanhas de  Harz, em Treseburg,  região frequentada por pintores. Continuando sua viagem, visitou a 4°  Sonderbund,  uma exposição que aconteceu em  Colônia  na Alemanha, na qual conheceu trabalhos de pintores modernos e famosos, incluindo-se  Van Gogh. 
Teve aulas também com  Lovis Corinth,  nome mais conhecido do que seu primeiro mestre. Alguns anos antes Corinth sofrera um acidente vascular cerebral (AVC) que, como sequela, tal como a aluna, lhe deixara alguma dificuldade motora na mão direita. Anita estava cada vez mais interessada pela pintura expressionista. Desejava aprender seu conceito e sua técnica. Em 1913, inicia aulas com o professor  Ernst Bischoff-Culm  da mesma escola de Corinth. Com a instabilidade política e social causada por uma guerra que se mostrava iminente, Anita Malfatti resolve deixar Berlim e passando rapidamente por Paris, retorna ao Brasil.

Primeira exposição individual - 1914



Em 1914, Anita tinha 24 anos e, depois de quatro anos de estudo na Europa, voltava para o seio familiar. Anita ainda tinha o desejo de partir mais uma vez em viagem de estudos. Sem condições financeiras, tentou pleitear uma bolsa junto ao  Pensionato Artístico do Estado de São Paulo. Por essa razão, montou no dia  23 de maio de 1914,  uma exposição com obras de sua autoria, exposição essa que ficou aberta até meados de junho..
O senador  José de Freitas Valle  foi visitar a exposição. Dependia dele a concessão da bolsa. Mas o influente político não gostou das obras de Anita, chegando a criticá-las publicamente. Entretanto, independentemente da opinião do senador, a bolsa não seria concedida. Notícias do iminente início da guerra na Europa fizeram com que o Pensionato as cancelasse. Foi aí que, mais uma vez, financiada pelo tio, o engenheiro e arquiteto Jorge Krug, Anita embarca para os  Estados Unidos.

Nos Estados Unidos



No início de 1915, Anita Malfatti já se encontrava em Nova Iorque e matriculada na tradicional  Art Student's League.  Nessa escola, Anita ia de um professor a outro na tentativa de encontrar o caminho que sonhava para seus trabalhos. Após três meses de estudos, desistiu de qualquer curso de pintura ou desenho nessa instituição, reservando-a apenas para os estudos de gravura. Anita ficou sabendo de um professor que deixava os alunos pintarem à vontade - ele lecionava na  Independent Scholl of Art  e se chamava  Homer Bross. 
Nas férias de verão, Homer Boss levou os alunos para pintar na costa do Maine,  na ilha de Monhegan.  Esse Estado litorâneo mais ao nordeste, fronteira com o  Canadá,  tornara-se há muito o refúgio dos artistas. Foi nessa ilha que Anita pintou, entre outras, a paisagem intitulada O farol.
Passado o verão, Anita voltou à Independent School of Art. Em meados de 1916, preparava-se para voltar ao Brasil.

De volta ao Brasil e segunda exposição individual - 1917


A estudante  (1915-1916), de Anita Malfatti. Acervo do  Museu de ARte de São Paulo.

Mário de Andrade de Andrade (sentado), Anita Malfatti (sentada, ao centro) e  Zina Aita  (à esquerda de Anita), em 1922.

           Anita Malfatti,  1930.
Em 1917, Anita resolveu promover sua segunda exposição.
Após a crítica de Lobato, publicada em  O Estado de São Paulo,  edição da tarde, em 20 de dezembro de  1927,  com o título de A propósito da exposição Malfatti, as telas vendidas foram devolvidas, algumas quase foram destruídas a bengaladas. Apesar da mágoa, Anita ilustrou livros de Monteiro Lobato e na década de 40 participou de um programa na Rádio Cultura  chamado "Desafiando os Catedráticos", juntamente com Menotti Del Picchia e Monteiro Lobato. Os ouvintes telefonavam fazendo perguntas para que o trio respondesse. Anita inicia estudos com o pintor acadêmico Pedro Alexandrino  no ano de 1919, e também com o alemão   George Fischer Elpons  um pouco mais avançado do que o velho mestre das naturezas mortas. Foi nessa ocasião que conheceu  Tarsila do Amaral  que tinha aulas com os mesmos professores. Depois do pai, o tio Jorge Krug, que a havia ajudado tanto, também faleceu e Anita precisou buscar caminhos para vender suas obras. Pedro Alexandrino já era um pintor de renome e vendia com facilidade seus trabalhos.

A Semana de Arte Moderna de 1922

Após o período de recesso, a  Semana de Arte Moderna,  mais uma vez, movimentou a vida artística insípida de São Paulo. Anita participou dela com 22 trabalhos. Uma vez que o círculo modernista vinha ao encontro de suas aspirações artísticas, ela entraria também para o  grupo dos cinco.

A Europa nos loucos anos 

Anita embarcava mais uma vez, em viagem de estudos para  Paris.  Seriam cinco anos de estudos pela bolsa do Pensionato. Este seria o último e o seu mais longo período fora do Brasil. Em agosto de 1922, ela tinha 33 anos e embarcava no vapor Mosella rumo à França. Mário de Andrade que não conseguiu chegar a tempo da partida de Anita e enviou-lhe um telegrama de desculpas. Apesar das muitas dúvidas que ainda tinha em relação a que caminho seguir na sua arte, não deixou de produzir.

Brasil, 1928

No final de setembro de 1928 Anita já se encontrava no Brasil. O ambiente artístico encontrado por Anita na volta era diferente do que deixara em 1923; o grupo inicial evoluíra, surgiam novos adeptos e novos movimentos. O número de artistas plásticos também crescera. Na chegada, Mário de Andrade noticiou imediatamente sua chegada, relembrando quem ela era.
Em 1929 abria em São Paulo sua quarta individual. Depois de fechar sua exposição, até 1932, Anita dedicou-se ao ensino escolar. Retomou suas aulas na Escola Normal Americana e foi trabalhar também na Escola Normal do Mackenzie College. Em 1933, muda-se para a Rua Ceará, no bairro de  Higienópolis,  onde instala seu ateliê e dá aulas, inclusive para Oswald de Andrade Filho, onde permanece até 1952, com a venda da casa, em razão da morte de sua mãe.


Cemitério dos Protestantes - Consolação



Em 6 de novembro de 1964, na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, Anita Malfatti morreu. Está sepultada no  Cemitério dos Protestantes,  na Rua Sergipe, número 117, bairro da Consolação, São Paulo.