Praça Patriarca - São Paulo
Trata-se de verdadeiro ícone da arquitetura paulistana. A iniciativa de sua construção deve-se a um italiano nascido em Luca, em 1870, que decidiu migrar Aos 19 anos para o Brasil. Aqui exerceu atividades de mascate e açougueiro, mas a perseverança com que enfrentou as condições de trabalho, aliada a excecional talento empreendedor, fez com que rapidamente galgasse lugar proeminente no mundo dos negócios.
As oportunidades surgiram quando ainda era funcionário de uma empresa de importação de secos e molhados, a Fratelli Fiaccadori, e cuidava do processo alfandegário em Santos. Não demorou muito para que Giuseppe Martinelli criasse sua própria empresa e passasse a exportar café e a fazer operações de câmbio, obtendo a representação de companhias de navegação.
Com a eclosão da Primeira Grande Guerra, investiu na compra de navios sucateados e manteve comércio regular com países europeus, o que lhe permitiu fundar o Lloyd nacional, empresa que vendeu ao governo brasileiro, mais tarde, com uma frota de 22 unidades. Dono de grande fortuna, Martinelli podia se dar ao luxo dos mais diversos atos de benemerência, como o que foi notificado pelo jornal O Paiz, em 29 de abril de 1916, ao fazer a doação de 100 mil francos a cruz Vermelha Italiana, na qual era agente no Brasil.
Na década seguinte, vamos encontrá-lo à frente de empreendimentos diversificados : as ricas minas de carvão de Jacuí e Butiá, no Rio Grande do Sul, as companhias de seguro Lloyde Atlântico e Indenizadoras, os estaleiros Guanabara e a manufatura de fumos Sanitas, no Rio de Janeiro, entre outros. Mas Martinelli acalentava, desde os tempos em que vivia na Itália, o sonho de realizar um obra de arquitetura. Como era proprietário de terreno na área central da cidade de São Paulo, na esquina da Rua São Bento com a Ladeira São João, pediu ao engenheiro húngaro William Fillinger que projetasse a construção de um edifício naquele lugar.
Os desenhos iniciais previam 12 andares , que logo se transformariam em 14 e, pouco depois em 18de dezembro de 1924, quando foi assinado o contrato com a Firma Amaral e Simões Engenheiros, era esse o escopo pretendido.
É importante lembrar como se apresentava a fisionomia urbana de São Paulo, naquela época, a fim de compreender o impacto da obra de Martinelli, eram poucos os edifícios altos na cidade.
O Prédio Martinico, de 1904, ficava no largo do Rosário ( hoje praça Antônio Prado) e seria logo suplantado pelo Edifício Guinle, de oito pavimentos na Rua Direita, e pelis 12 andares da sede do escritório de Ramos de Azevedo, na rua Boa Vista. Em 1924, seria a vez do edifício Sampaio Moreira, na Líbero Badaró, cujos 14 pavimentos configuravam a estatura de um verdadeiro arranha -céu. A regulamentação do uso de elevadores, em1920, e a abertura da primeira fábrica de cimentos Portland, em Perus, em 1926, foram importantes fatores para o desenvolvimento da verticalização paulistana, embora se manifestasse, nesse período, um verdadeiro embate entre diferentes tipos de restrição ao adensamento urbano expressos na legislação municipal.
O projeto de Giuseppe Martinelli, estimulado pela perspectiva de superar os marcos arquitetônicos então existentes na cidade e aqueles que surgiam no Rio de Janeiro e em Bueno Aires, foi se tornando cada vez mais ambicioso e complexo. Os problemas começaram com as primeiras escavações e a necessidade de drenar a inesperada quantidade de água que minava no subsolo do terreno. Os alicerces do prédio vizinho ficaram abalados, e sua proprietária embargou as obras do novo edifício: a solução foi comprar o imóvel, o que levou o empresário a dotar o projeto original de mais um bloco. A quantidade de material necessário - madeira, pedra britada, ferro de aço e cimento, importad da Suécia e da Noruega - implicava tanta despesa que levou a construtora à falência, dois anos depois. Os trabalhos passaram então a ser coordenados pelo próprio Martinelli e por seu sobrinho, Ítalo Martinelli, arquiteto formado pelo Mackenzie. A planta original ia sofrendo alterações, à medida que lhe eram acrescentados novos pavimentos. Os 20 andares previstos na planta de 1928 transformaram-se 24, acarretando novo embargo das obras, desta feita por iniciativa da Prefeitura. O episódio foi bastante explorado pela imprensa, que, em suas hipóteses alarmistas, contou com as afirmações dos engenheiros falidos, que moviam ação contra Martinelli.
Giuseppe Martinelli vendeu o prédio a um banco italiano em 1934, para saldar dívidas contraídas durante sua construção. de volta ao Rio de Janeiro, refez sua fortuna com outros empreendimentos : minas em Santa Catarina, companhia de navegação, salinas no Norte do país e até mesmo empresa de distribuição das produções do cinema o italiano ( a Star Filmes).
Embora afastado de São Paulo, cultivou até sua morte, em 1946, o orgulho de ter sido responsável pelo mais alto edifício da cidade. Tal primazia só seria desbancada um ano depois, com a inauguração de outro monumento paulistano : a sede do Banespa.
Revista do Historiador - edição 167.
Foto da inauguração do Edifício Martinelli em 1929 |
Giuseppe Martinelli |